Cidade de São Tomé, onde o paraíso acaba e África começa…

A cidade de São Tomé é África em toda a sua essência. A confusão, o lixo, os cheiros, o trânsito, a azáfama… Há tanto adjectivos que poderíamos utilizar para caracterizar esta cidade.

Capital deste pequeno e maravilhoso país que é São Tomé e Príncipe, São Tomé tem cerca de 65.000 habitantes, o que representa aproximadamente 35% de toda a população do país, que totaliza 187.000 habitantes.

Durante a nossa estadia no país, passámos por três vezes em São Tomé que documentámos nos diferentes posts que fomos colocando ao longo do percurso. Resolvemos no entanto dedicar um único post ao dia e meio que reservámos para passar na cidade, tempo mais do que suficiente para a conhecer.

Chegámos já perto da hora do almoço vindos do ilhéu das Rolas, por isso procurámos um local para almoçar. Descobrimos o restaurante Sabores da ilha que fica no parque popular da cidade e foi uma agradável surpresa. Comemos um peixe grelhado muito fresco, saboroso e bem confecionado.

No final da refeição ainda ficámos um pouco a conversar com a proprietária que nos contou um pouco do dia-a-dia da ilha e das alterações que, infelizmente, têm ocorrido nos últimos tempos. Contou-nos ela, que São Tomé está a deixar de ser aquele paraíso sem criminalidade e que já começam a aparecer pequenos focos, muito à custa do enorme crescimento da população sem acompanhamento de crescimento económico e emprego. Claro que continua a ser um país muito seguro, e onde felizmente ainda podemos andar à vontade e sentirmo-nos bem recebidos.

Depois de almoço, resolvemos dar uma volta pelo centro da cidade.

Como sempre, e porque achamos que não há melhor sítio para conhecer o ritmo de uma cidade, fomos visitar o mercado, e em África, por menos expectativas que tenhamos, é dos locais que nos consegue sempre surpreender. Este é especialmente desorganizado e ruidoso e em algumas partes é bastante sujo. No mesmo local onde vendem fruta, legumes, peixe, carne, tartaruga (sim, tartaruga!) e sei lá mais o quê que se possa vender, corre também um pequeno esgoto a céu aberto e tudo está aqui é apresentado com pouco cuidado, segurança e higiene.

Infelizmente não conseguimos fotografar à vontade, pois havia sempre alguém a reclamar e se pedíamos também não deixavam e mostravam-se até ofendidos com a proposta. Mas fizemos um pequeno vídeo discretamente que vos deixamos na íntegra e com o som original para que possam viver a experiência na primeira pessoa. Pena é, que não consigamos transmitir também os cheiros…

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Quando falamos que o povo é afável e chegamos á cidade parece que estamos noutro país bem diferente daquele onde passámos esta última semana. O povo, pela ilha é extraordinariamente simpático e comunicativo e aqui, nota-se o crescimento de alguma antipatia perante os visitantes. Perdem a sua essência e simplicidade, em detrimento da desconfiança e tentativa de ludibriar o próximo.

Percorremos depois as ruas do centro da cidade onde existem alguns pontos de interesse como a catedral, o palácio do governador (presentemente casa do chefe de governo) e principalmente as lojas que se mantêm até hoje com poucas alterações comparativamente ao que eram há décadas atrás! Existem mesmo algumas que parece que pararam no tempo.

Caminhando livremente, ficamos com a ideia de como vive este povo e podemos afirmar, sem qualquer tipo de dúvidas, que vivem muito melhor fora da cidade e principalmente no Príncipe! Muitos nos diziam que o Príncipe era mais pobre mas não foi essa a ideia com que ficámos. Tem um acesso mais restrito a muitos produtos? Sim, claro! Já é difícil chegar algo a São Tomé quanto mais ao Príncipe. Nesse aspecto sente-se a dupla insularidade, mas as pessoas são mais felizes, menos preocupadas, mais autênticas…

São Tomé é uma cidade onde, à excepção de um ou outro edifício com traça mais moderna, nada parece ter mudado desde a independência. Para terem noção, e a título de exemplo, o porto da cidade não permite atracar navios de grande porte. Pela baía vemos esqueletos de barcos encalhados pois o porto é ao largo! Os contentores são transportados dentro de uma balsa puxada por um rebocador e apenas aí, ao largo, é feito a troca para os cargueiros. Como comentava o Rui, com algum exagero e sem perder a graça, construíram o Porto no único sítio onde não atracavam navios.

São Tomé é uma cidade pouco limpa, desorganizada, com pouca iluminação, surpreendentemente cheia de mosquitos e não muito acolhedora. Quem visita a cidade no início da viagem poderá não sentir isso mas quem o faz por último inevitavelmente acabará por sentir. Haverá sempre alguém a interpelar-nos sobre as fotografias que tiramos, para comprar artesanato, para cambiar dinheiro, ou a pedir algo… Enfim, haverá sempre alguém a contar que a nossa atitude poderá mudar a sua vida!

Entretanto e porque em viagem há sempre histórias engraçadas para contar, na nossa incessante procura de livros identificativos dos locais que visitamos, fomos até ao Arquivo Histórico de São Tomé, junto à biblioteca e ao parque popular. Não conseguimos encontrar o que pretendíamos mas encontrámos uma loja de artesanato muito peculiar. Naquela loja o espaço era partilhado por vários artistas, onde cada um tinha uma área para expor os seus produtos. O que acontecia era que tomássemos atenção a alguma peça de um dos artistas, teríamos de lidar com os outros todos a falar ao mesmo tempo e a tentar chamar a nossa atenção. O espaço até tem peças muito interessantes, mas torna-se quase impossível sequer “pensar” sem ter todos ao mesmo tempo em cima de nós. Se tivessem mais organização e fossem menos gananciosos, que, com a qualidade que apresentam, venderiam com certeza muitas mais peças.

Na manhã seguinte tínhamos ainda alguns locais que queríamos visitar e teríamos tempo até às 19h00 para depois entregar o carro no Aeroporto e preparar o nosso regresso.

Por isso, começámos por ir ao forte de São Sebastião, edificado em 1575 com carácter defensivo e onde funciona hoje o Museu Nacional. Diante do mesmo, uma homenagem aos descobridores portugueses João de Santarém, Pêro Escobar e João de Paiva.

O forte em si está muito bem preservado e o Museu é uma exposição de alguns objectos recolhidos das antigas Roças, e como é normal e legítimo, explica aos mais desatentos, através de fotos e documentos históricos, o sofrimento dos santomenses durante o tempo do domínio português e da escravatura, e como era a vida nas plantações de cacau e café.

E muito embora Portugal tenha sido dos primeiros países da Europa a abolir a escravatura em 1761 na metrópole e Índias, e em 1854 nas colónias, também é verdade que as condições de trabalho dos operários das roças durante o período do Estado Novo se aproximavam muito dessa definição, por isso tudo é compreensível.

Aproveitam também no mesmo espaço para promover o artesanato e a cultura local, que é variado e bastante interessante, assim como a riqueza natural existente na vida marinha.

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Logo em frente fica o espaço CACAU (Centro de artes, criação, ambientes e utopia) onde existe também um restaurante explorado pelo Chef João Carlos Silva. O espaço actua em diferentes áreas como a cultura, música e artes em geral. Na altura em que visitámos havia uma exposição de pintura e fotografia muito interessante, mas existe sempre aqui algum evento ou exposição permanentemente. Sendo um espaço único na cidade merece a sua visita, mas ao final do dia ou ao jantar contem com mais animação.

Para terminar em beleza, nada com um almoço no restaurante Filomar. O Filomar fica situado um pouco antes do Omali Resort, no início da baía Ana Chaves e tem uma fantástica vista e um ambiente bastante agradável. Para não variar, peixe grelhado delicioso e de óptima qualidade. O peixe é realmente muito bom em São Tomé.

Durante a manhã ainda passámos na fábrica de chocolates Cláudio Clorallo, mas como as visitas têm horário especifico e é necessário adquirir uma senha, apenas conseguimos a visita das 16h40. Se pretendem visitar aconselhamos a que passem o mais cedo possível para comprar a senha (100 contos=4€) para garantir que fazem a visita no dia pretendido, pois o número de senhas é limitado.

O Cláudio Corallo começou a produzir café em 1974 no Zaire, mas só na década de 90 iniciou a produção de cacau quando se mudou para São Tomé e Príncipe. Desde então tem conseguido, ao longo destes anos, criar uma marca consistente que associa qualidade e diversidade aos produtos de São Tomé.

Segundo palavras do próprio “ O nosso chocolate não nasce na fábrica, nasce no campo”.

No Príncipe, uma das roças que visitámos (Terreiro Velho) é onde produzem o cacau, café Ibérica e pimenta. A outra fica em São Tomé (Nova Moca) e produz apenas café mas noutras variedades. A visita é realizada no laboratório onde, além da história de Cláudio Corallo, somos levados a conhecer a essência do cacau o modo como se produz para obter um chocolate de excelência. Ao longo destas explicações vamos degustando os vários sabores e combinações produzidas pela marca podendo, após a visita, comprar os chocolates aqui produzidos. Se não fizer a visita à fábrica pode na mesma comprar os chocolates no supermercado que o preço é praticamente o mesmo.

Chegados ao Aeroporto ainda tivemos vendedores de artesanato e flores a pedirem-nos mais um pouco da nossa atenção.

Na nossa opinião, não achamos a cidade em si algo de extraordinário, mas consideramos a sua visita essencial e importante para conhecer bem este extraordinário país que é São Tomé e Príncipe!

Nota: Viagem realizada em Outubro de 2016

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