Graciosa, a Ilha Branca

É a segunda mais pequena ilha do arquipélago dos Açores e também uma das menos visitadas, mas a Graciosa, nos seus cerca de 12 Km de comprido por 7 de largo, tem muito mais para oferecer do que à primeira vista se possa pensar.

A “Ilha Branca”, assim foi chamada, pela mão do escritor Raúl Brandão em 1926, no seu livro As ilhas Desconhecidas. Mas na verdade, a Graciosa é tão verde como as suas companheiras do Grupo Central. Bem, talvez um verde ligeiramente diferente, já que esta não é uma ilha como as outras. A sua posição geográfica e uma paisagem mais plana, que se traduz em muito menos chuva ao longo do ano, faz com que no final do Verão, o seu tom de verde menos exuberante aliado ao casario branco das suas povoações, lhe dê ao longe, um toque ligeiramente mais esbranquiçado.

Ingratamente apelidada de “patinho feio” dos Açores, e tantas vezes menosprezada, a pequena Graciosa tem igualmente paisagens maravilhosas e uma beleza única, e merece por isso o nosso destaque.

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Chegamos ao final da manhã, vindos de Lisboa (com escala na Terceira, já que não há voos directos) e em virtude da falta de transportes no dia seguinte, fomos “obrigados” a ficar na Graciosa por 2 noites. E em boa hora isso aconteceu, pois teríamos cometido o mesmo erro de a menosprezar e não teríamos tido a oportunidade de a conhecer tão bem.

O nosso primeiro destino foi a Vila da Praia, a segunda maior povoação da ilha. É do seu porto que partem os barcos para as restantes ilhas e onde se situa a Praia de São Mateus, a única praia de areia e por isso apinhada de gente nos dias mais quentes. E este sábado não era excepção. O dia, apesar de nublado, estava quente e as suas águas tépidas convidavam a banhos.

Foi aqui que escolhemos ficar alojados, mais propriamente no Moinho de Pedra, um dos moinhos que pintam de colorido a paisagem graciosense. E que privilégio, poder adormecer ao som das ondas do mar e avistar logo pela manhã, o Ilhéu da Praia, no horizonte.

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Estes moinhos são um dos pontos mais emblemáticos da Graciosa, que foi em tempos idos, o “celeiro” dos Açores, pois em virtude do seu clima, era a única que produzia trigo e cevada. Hoje em dia, todos estão desactivados e alguns recuperados e convertidos em turismo de habitação, proporcionando a quem aqui pernoita uma experiência única.

Bem por trás dos moinhos fica a fábrica das famosas queijadas da Graciosa. Durante a semana é possível fazer uma visita guiada à mesma, mas se apenas quiser provar ou mesmo abastecer-se há também uma loja. Foi o que fizemos, era sábado e por isso só a loja estava aberta. Além das queijadas, há também outras doçarias, mas as que mais gostamos são mesmo as crocantes e deliciosas queijadas tradicionais. Não deixe de as provar, e leve também para os seus familiares e amigos. De certeza que vão adorar!

A seguir ao almoço, era hora de começar a explorar a pequena ilha. É certo que, a volta inteira pela costa é possível de fazer em menos de 2 horas e isso já contando com algumas paragens pelo caminho, mas nós preferimos fazê-lo bem devagar e saborear o seu ritmo lento e de calmaria. Uma coisa é certa, aqui é difícil alguém se perder, pois se nos enganarmos na estrada, quando damos por ela estamos de regresso ao ponto de partida. 🙂

Regressámos por isso a Santa Cruz, a sua maior povoação e único concelho da ilha. Da Praia até lá são cerca de 10 minutos de carro, mas que depressa se transformaram em 20, pois a primeira paragem foi logo no miradouro do Quitadouro. Impossível não parar e contemplar a vista panorâmica da vila da Praia com o ilhéu, Reserva da Biosfera, ao largo.

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Mais um ligeiro desvio, leva-nos a outro local incontornável da ilha, o miradouro de Santa Cruz, situado no monte de Nossa Senhora da Ajuda. Ao longo da estrada que nos leva até lá passamos pelas 3 ermidas erguidas na sua encosta, a ermida de São João, a ermida de São Salvador e a que fica no seu ponto mais alto e que lhe dá o nome, a ermida de Nossa Senhora da Ajuda, construída de 1717 numa prece divina contra os frequentes terramotos que naquela altura se faziam sentir.

Do miradouro quase podíamos dizer que se consegue avistar toda a ilha e em todas as direcções, e a vista é simplesmente maravilhosa com Santa Cruz e o mar a completar o cartão postal. Mas além da vista, o monte guarda um outro segredo, desta feita, no seu interior. A praça de Touros, curiosamente construída na cratera deste pequeno vulcão extinto e que é ainda hoje palco de muitas touradas principalmente durante as festas da Graciosa.

Descemos depois até ao centro histórico da Santa Cruz. Parámos o carro no Largo de Santa Cruz e percorremos as suas poucas ruas a pé. Aqui o tempo passa, mas não corre, os carros ficam destrancados e as janelas abertas, e o café da praça é ponto de encontro ao final da tarde, onde também nós, mais logo, haveríamos de regressar.

A praça é o seu ponto mais central, hoje com dois grandes lagos, outrora, paúis, que serviam para fazer a retenção da pouca água existente na ilha e posteriormente utilizada na rega e para dar de beber aos animais. Existe também um Museu, que não visitámos, e logo ali ao lado as suas duas igrejas, a Matriz e a da Misericórdia.

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Seguimos em direcção ao Farol da Ponta da Barca situado na ponta mais a noroeste na ilha. Pelo caminho passámos pelo Barro Vermelho, uma zona balnear muito bem cuidada, com todas as condições para um dia em família, junto a uma pequena enseada de “areia” vermelha. Nem dois minutos depois, chegamos ao Farol e daqui avistamos o pequeno ilhéu, a que a força da natureza, ironicamente, havia de dar a forma de uma baleia, aquele que é o animal marinho que mais associamos aos Açores.

Regressamos a Santa Cruz, pelo interior da ilha, passando pelo pequeno vilarejo de Guadalupe. Depressa estamos de volta, aqui tudo é perto de tudo. Acabámos a tarde, sentados no café da praça, a beber umas imperiais só a ver o tempo passar. As conversas e os olhares caíram sobre nós, pois toda a gente conhece toda a gente, e não é costume haver por aqui gente de fora.

Contam os mais velhos, que há muitos anos atrás, quando algum estranho por lá aparecia, se fosse apanhado a roubar, era amarrado a um poste no porto e só o soltavam quando o metiam no barco para o despachar para outra ilha. Não sabemos se a história é lenda ou verdadeira, apenas sabemos que aqui as portas nunca estão trancadas.

O dia seguinte estava reservado para o lado oposto da ilha e para algumas caminhadas, pois é a pé que verdadeiramente se conhece a beleza das ilhas dos Açores. E a Graciosa não é excepção.

Por isso, acordamos cedinho e seguimos em direcção à Caldeira da Furna do Enxofre. Assim que atravessamos o túnel que nos leva ao seu interior, parece que mudámos de ilha. De repente, entramos numa floresta encantada, um prado de um verde intenso rodeado de árvores e vegetação exuberante. É incrível a diferença de paisagem!

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Deixámos o carro e regressámos a pé até ao exterior da Caldeira. O objectivo era fazer a trilha à sua volta e depois regressar para visitar a Furna. São quase 11 km de paisagem verde debruçada sobre o azul do mar com a ilha do Pico a acompanhar-nos em cerca de metade do percurso e leva pelo menos 3 horas a percorrer. Chegámos ao final cansados, mas com a sensação de que se não a tivéssemos feito, jamais teríamos conhecido a verdadeira beleza da Graciosa.

Regressámos ao ponto de partida, e no final da estrada, lá estava o moderno edifico, porta de entrada para a imensa descida até ao interior da Furna do Enxofre. Após uma pequena caminhada por entre vegetação densa, entramos na torre de acesso. Agora é sempre a descer!

É estranho sabermos que estamos a entrar no interior do vulcão, e de onde partiu a erupção que deu forma à ilha. Uma vez no seu interior, além de uma pequena lagoa de água fria, ainda podemos ver o borbulhar de uma fumarola que teima em manter-se viva. Foi o príncipe Alberto I do Mónaco, um dos primeiros exploradores a entrar nesta gruta vulcânica quando em 1939 se juntou a uma expedição à ilha da Graciosa.

Entretanto a fome já apertava e muito, e depois de tanto esforço físico, já merecíamos um descanso. Por isso, lembram-se da floresta encantada? Foi aí mesmo, o local escolhido para nos instalarmos a saborear o piquenique que tínhamos trazido connosco.

Próxima paragem, a Ponta do Carrapacho, de onde podemos observar o Ilhéu de Baixo. Mais um ponto de paragem obrigatório para observar a paisagem. Logo ali ao lado, ficam também as termas do Carrapacho e a baía da Poça, piscinas naturais adaptadas para uso balnear, um óptimo local para um mergulho.

Ainda era cedo e já tínhamos terminado o percurso que tínhamos delineado para a nossa estadia por aqui, por isso subimos ao ponto mais alto da ilha, a Caldeirinha de Pêro Botelho e daí descemos a pé, até à Vila da Praia, onde chegaríamos já ao final da tarde.

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E foi mais uma caminhada inesquecível, pois além da paisagem, que já nem vale a pena voltar a dizer o quão maravilhosa é, não chegámos ao destino sem passar por umas dezenas de vacas, uns quantos burros-anão (espécie autóctone em vias de extinção) e até um simpático cavalo.

Fechamos o dia no melhor e mais recomendado restaurante da ilha, o JJ, situado bem em frente à praia de São Mateus, a 5 minutos a pé do nosso moinho. E apenas vos podemos dizer que foi uma das melhores refeições que fizemos nos Açores ao longo de toda a semana.

No dia seguinte é hora de partir, mas partimos de alma cheia. Foram 2 dias de natureza intensa e levamos por isso a Graciosa no coração.

Este artigo faz parte de uma publicação colectiva de vários blogues do grupo TravelBloggersPT sobre o arquipélago dos Açores.

Não perca o que tem eles a dizer sobre as restantes ilhas:

As Flores pelo Gato Vadio, São Jorge pelo Um Dia Vamos e a Terceira pelo ADN Aventureiro. O Let´s Run Away leva-nos até Santa Maria e os Destinos Vividos ao Pico. Com o TravelB4Settle, o Route 92 e o Carimbo no Passaporte vamos até São Miguel, E chegamos, por fim, ao Corvo com o Luis Ferreira.

Nota: Viagem realizada em Junho 2018

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